SERES CAMINHANTES
Afirmam que os verdadeiros ambientalistas são os ruralistas da Agricultura
Familiar, roceiros assumidos, que metem a mão literalmente em seus cultivos
orgânicos, livres de qualquer corrente ideológica, até porque no sistema de Agricultura
Familiar impera a necessidade de interagir com a naturalidade da lida diária no
meio rural, já que dela depende o equilíbrio de um metabolismo nutricional-orgânico,
ganhos incontáveis em termos de saúde humana e ambiental.
Deus
sujeitou toda criação ao homem: “E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem,
conforme a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves
dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre todo o réptil que se
move sobre a terra. E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o
criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou, e Deus lhes disse:
Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar
e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra. E
disse Deus: Eis que vos
tenho dado toda a erva que dê semente, que está sobre a face de
toda a terra; e toda a árvore, em que há fruto que dê semente, ser-vos-á para
mantimento. E a todo o animal da terra, e a toda a ave dos céus, e a todo o
réptil da terra, em que há alma vivente, toda a erva verde será para
mantimento; e assim foi. E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito
bom; e foi a tarde e a manhã, o dia sexto”. (Bíblia Almeida)
“Os
agricultores são os
verdadeiros ... Com a aprovação da Lei 12.651 em 25 de maio ... eles são os verdadeiros ambientalistas”,
...
“A natureza é, em nossa
sociedade, um objeto a ser dominado pelo homem, muito embora
saibamos que nem todos os homens são proprietários da natureza. Assim, são
alguns poucos homens que dela verdadeiramente se apropriam. A grande maioria
dos outros homens não passa, ela também, de objeto que pode ser até descartado”. (GONÇALVES, 1996, p.
26-27) Fonte: https://www.seer.furg.br/remea/article/view/3291/2221
[...] E
as consequências que derivam desse modo de produção (e de vida) exploratório
não são as mesmas para todos. Conquanto a vida possa ser transformada em
mercadoria para fins de acumulação de riqueza material, impondo a desigualdade
social, torna-se aceitável que condições indignas de vida e a restrição no
aceso a bens básicos de sobrevivência sejam impostos a uma parcela considerável
da população mundial, para garantir o bem-estar de poucos. Esses quadros de
injustiça ambiental são cada vez mais frequentes, em que grupos em situação de
vulnerabilidade social são os que mais sofrem as consequências da degradação
ambiental. (ACSELRAD et al., 2009).
[...] “As
instituições que se impuseram em nossa sociedade pretendem aparecer a cada um
de nós como habituais, rotineiras, eternas, em suma, naturais. [...] [nessa
concepção] o natural quer dizer o imutável... Com frequência ouvimos dizer que
sempre houve ricos e pobres ou opressores e oprimidos e que, portanto, isso é
natural – logo, imutável. Isso não passa de uma boa maneira de se deixar tudo
como está. Pretende-se congelar a história, a sociedade e a cultura, enfim,
manter o status quo. [...] Portanto devemos ter muito cuidado quando nos tentam
convencer de que isso ou aquilo é natural pois, quase sempre, o que se está
querendo exatamente escamotear é aquilo que é da natureza da história, da
sociedade e da cultura, isto é, a tensão e o conflito de onde o novo, o
diferente, podem brotar.” (GONÇALVES, 1996, p. 44)
Entretanto, esse modo de
relacionar-se com a natureza não deve ser naturalizado. O conceito de natureza
não é único, e cada cultura, de acordo com a forma com que se interconecta com
essa natureza, desenvolve o seu entendimento acerca dela, a partir das relações
que com ela estabelece:
“[...] os seres humanos [...]
não conseguem ter acesso à realidade perceptível por seus sentidos senão por
meio de representações mentais construídas pelo cérebro em conexão com o
ambiente cultural em que vivem. Eis porque as noções de tempo, de espaço, de natureza,
de sociedade e do próprio ser humano variam de um sistema cultural para outro.
(SOFFIATI, 2011, p. 29-30)”
[...] No
Brasil, em 2000, sancionou-se uma lei que possibilitou o debate político sobre
essa situação, acrescentando ao cenário o conceito de “Reserva Extrativista” e
a ideia de povos da floresta cunhados na luta do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais da cidade de Xapuri, no Acre, coração da Amazônia brasileira. Ou seja, é
um outro modo de concepção das unidades de conservação, o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza (SNUC – Lei 9985/2000). Mesmo que ainda com
certos problemas e questões a serem revistas, o novo sistema, de certa maneira,
procura incorporar a importância da presença humana, ao propor a criação de
dois tipos de unidades: as de proteção integral e as de uso sustentável
(BRASIL, 2000). Nestas últimas, é permitida a realização de manejo sustentável
de recursos naturais por populações tradicionais habitantes da área. Contudo, a
ideia de santuários naturais permanece. No caso dos parques, a presença humana
é permitida para atividades de educação e interpretação ambiental, recreação em
contato com a natureza e de turismo ecológico (SNUC, Art.11). Mais
recentemente, por meio de Instrução Normativa n° 26 de abril de 2012, o ICMBio
regrou os usos diretos em UCs de proteção integral para as populações
tradicionais, garantindo sua permanência no território protegido, e corroborando
a contradição entre a proteção integral e o uso sustentável como elementos
opostos. É nesse momento que a proposta de educação ambiental crítica,
elaborada no âmbito do IBAMA desde a década de 1990, fundamental para se
pensar e definir a especificidade desta na gestão ambiental pública e seus
instrumentos (QUINTAS, 2000, 2004, 2009)
[...] As
vivências em EA, dessa forma, devem impulsionar para o desenvolvimento de
propostas tanto para a UC quanto para além de seus limites, atingindo também a
comunidade do entorno, em uma visão integrada de gestão, trazendo para a
discussão questões ambientais que estejam tanto vinculadas à área protegida
quanto aos contextos locais e globais nos quais ela se insere e com os quais
direta e indiretamente se relaciona. Entretanto, o que tem ocorrido na prática
é uma “visitação” que se resume a um processo pontual, contemplativo, a uma
imersão “momentânea” no ambiente, não instigando à participação, à compreensão
crítica do contexto socioambiental em que a unidade está inserida, à atuação
cidadã ou o planejamento integrado que atenda às necessidades na relação
UC-comunidade. Com isso, a sensibilização proporcionada pela vivência acaba se
encerrando no indivíduo, não promovendo a geração de processos participativos e
de intervenção.
[...] O
indivíduo não se torna consciente (no sentido ético-político da palavra) de
forma imediata e sem o diálogo com o outro que constitui o processo educativo.
É por meio da constante vivência da práxis, em um refazer-se contínuo, que o
ser humano transforma o mundo e nesse movimento transforma a si mesmo. A conscientização, assim, caracteriza-se como
um processo aberto, coletivo, inerente à relação educador-educando, ou, como
colocado por Iasi (2011), sujeito a avanços e recuos. “A consciência não “é”,
“se torna” (Idem, p.12). Agindo no mundo, e interagindo socialmente, é que o
ser humano se coloca questionamentos, alimenta dúvidas, constrói soluções; é
nessa interação do seu “eu” com o outro e com a coletividade que o humano se
conscientiza: “Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao
contrário, é o seu ser social que determina sua consciência.” (MARX, 1982 apud
NETTO, 2012, p. 271).
[...] Como
seres inacabados é que homens e mulheres se constituem, em um “permanente
movimento de busca”:
A consciência do mundo e a
consciência de si como ser inacabado necessariamente inscrevem o ser consciente
de sua inconclusão num permanente movimento de busca. [...] É nesse sentido
que, para mulheres e homens, estar no mundo necessariamente significa estar com
o mundo e com os outros. Estar no mundo sem fazer história, sem por ela ser
feito, sem fazer cultura, sem “tratar” sua própria presença no mundo, sem
sonhar, sem cantar, sem musicar, sem pintar, sem cuidar da terra, das águas,
sem usar as mãos, sem esculpir, sem filosofar, sem pontos de vista sobre o
mundo, sem fazer ciência, ou teologia, sem assombro em face do mistério, sem
aprender, sem ensinar, sem ideias de formação, sem politizar não é possível.
(FREIRE, 1998, p. 64)
[...] Assim,
o planejamento de uma ação de educação ambiental junto ao ambiente natural deve
proporcionar o desenvolvimento de uma práxis transformadora e incluir
diferentes etapas: 1. Experimentação: é a vivência em si. É o momento em que se
desenvolvem trilhas, atividades que trabalhem com as subjetividades dos
sujeitos, que promovam interações entre os sujeitos e destes com o ambiente; 2.
Reflexão: é o momento em que se reflete sobre a experiência vivida,
compartilha-se impressões, dúvidas, certezas. A partir do que foi vivenciado, discute-se
sobre as questões ambientais mais amplas relativas ao local e ao global, suas
causas e consequências. Como colocado por Freire (1998): “Constatando, nos
tornamos capazes de intervir na realidade, tarefa incomparavelmente mais
complexa e geradora de novos saberes de que simplesmente a de nos adaptar a
ela” (p.86). 3. Proposição: a partir das conclusões a que se chega por meio
dessa reflexão, o grupo deve construir, junto, estratégias de ação e
intervenção no seu mundo: comunidade, bairro, cidade, estado...
4. Ação: momento em que a
proposta é colocada em prática pelos agentes: “Agente é o que age, o que atua e
não o que tem apenas a possibilidade ou disponibilidade de atuar ou agir”
(VÁZQUEZ, 2011, p. 221). 5. Reflexão: após a realização da ação, novamente
tem-se um momento de reflexão para avaliações e novos compartilhamentos,
buscando identificar os pontos positivos e aqueles a serem revistos, replanejados
e retrabalhados. É importante perceber que as diferentes etapas são sucessivas
e se interconectam, em movimento.
Figura 1 – As diferentes
etapas que devem constituir o processo educativo de uma ação de educação
ambiental junto ao ambiente natural, arranjadas em um movimento contínuo.
Essas mesmas etapas, no
entanto, não estão circunscritas dentro de um movimento fechado. Sendo práxis
geradora de consciência, elas se sucedem em “espiral”, com “idas e vindas”,
em um processo aberto:
Figura 2 – O processo aberto
de realização de uma ação de educação ambiental e a formação da consciência,
por meio da práxis, podem ser compreendidos como uma espiral, em que os
movimentos se sucedem continuamente. A cada nova “volta” da espiral, novos
processos acontecem (representados pelas diferentes cores). E= experimentação;
R= reflexão; P= proposição; A= ação. Adaptação de imagem disponível em:
http://sbsxrx.wordpress.com/2008/07/29/espiral-3d-con-trapcode-particular/
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